O Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, em Brasília (DF), derrubou, nesta sexta-feira (16), a liminar que determinava a suspensão da licença prévia concedida à construção da Hidrelétrica de Belo Monte e o cancelamento do leilão de compra de energia da usina.
A liminar havia sido expedida pela Justiça Federal do Pará na quarta-feira (14) em função de uma ação ajuizada pelo Ministério Público Federal, no dia 8, tratando das irregularidades do empreendimento. O governo federal, por sua vez, entrou com um recurso no TRF, através da Advocacia Geral da União (AGU), pedindo a suspensão da liminar.
Com a decisão favorável do TRF, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou que manterá a realização do leilão para a próxima terça-feira (20) e todos os prazos referentes à realização do empreendimento.
Populações tradicionais
A decisão do juiz federal Antonio Carlos Almeida Campelo, da Subseção de Altamira (PA), em determinar o cancelamento do leilão e a suspensão da licença prévia concedida pelo Ibama, baseava-se no fato de que a construção da usina causará impactos em áreas indígenas. De acordo com a liminar, a licença prévia descumpre o que estabelece o artigo 176 da Constituição Federal, que exige que qualquer aproveitamento hidrelétrico em terras indígenas seja precedido por uma lei específica.
Na quinta-feira (15), o diretor de licenciamento do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Pedro Alberto Bignelli, reagiu à conclusão da Justiça Federal e defendeu que o empreendimento não afetará diretamente terras indígenas da região.
No entanto, um relatório realizado pela Relatoria do Direito Nacional ao Meio Ambiente, da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (Plataforma Dhesca Brasil), lançado no último dia 8, denuncia que a UHE de Belo Monte, que será construída no Rio Xingu (PA), afetará milhares de indígenas da região.
Intitulado “Missão Xingu - Violações de Direitos Humanos no Licenciamento da Usina Hidrelétrica de Belo Monte”, o estudo foi produzido por relatores que percorreram toda a região da Bacia do Xingu. De acordo com o relator José Guilherme Zagallo, a missão realizou audiências públicas, nas quais conversou com a população ribeirinha e representantes de comunidades indígenas que sofrerão impactos com a construção da barragem.
O relatório aponta as irregularidades no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) realizado pelo Instituto Chico Mendes (ICMBio), a pedido da Eletronorte em nome da holding Eletrobrás, responsável pela obra.
De acordo Zagallo, a falha mais grave do EIA é a falta de realização das Oitivas Indígenas, que são audiências com representantes das populações tradicionais para debater o projeto.
“Nós conversamos com diversos representantes das tribos indígenas da região, são 24 etnias, e a maior parte delas afirmou que as reuniões que aconteceram foram reuniões da Funai com os índios. Foram reuniões técnicas, em que a Funai afirmava incessantemente que não eram as oitivas previstas na convenção 169 da OIT, da qual o Brasil é signatário, e que posteriormente seriam oficializadas as oitivas. [Essas reuniões] eram uma primeira apresentação”, conta Zagallo.
O relatório destaca que as Oitivas Indígenas são obrigatórias pela legislação brasileira e pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 2002, “que garante aos indígenas o direito de serem informados de maneira objetiva sobre os impactos da obra e de terem sua opinião ouvida e respeitada”.
Cecília Mello, assessora da Relatoria e integrante da secretaria nacional da Rede Brasileira de Justiça Ambiental, que também participou da missão, ainda afirma que em uma das audiências realizadas com a população que será impactada pela UHE de Belo Monte, em Altamira, muitos indígenas ficaram ser ter o debate traduzido para sua língua. “[Os indígenas] não estavam sabendo o que estava sendo discutido, e muito menos tinham capacidade de intervir”, protesta.
Povos Isolados
Além disso, Cecília Mello conta que o EIA de Belo Monte não considera o fato de existirem povos indígenas isolados na região da Bacia Xingu.
No Estudo de Impacto Ambiental levanta-se a hipótese de existência de grupos isolados nas cabeceiras do igarapé Ipiaçava, no limite norte da Terra Indígena Koatimeno, em Altamira (PA), área que está sendo considerada pelo EIA como indiretamente impactada pela construção da hidrelétrica. No entanto, conforme o relatório da Plataforma Dhesca Brasil, há ausência de estudos específicos sobre esses indígenas isolados.
Mello explica que, além do impacto direto às populações que moram nas regiões que serão alagadas pela barragem, há que se considerar os danos que as obras no rio acarretarão para a biodiversidade e para as populações que dependem dele para sobreviver.
Segundo a assessora, o rio Xingu tem um papel de muita importância para essas populações, sobretudo os povos indígenas. “Tem toda uma relação milenar deles com esse rio que seria completamente interrompida com o barramento”, completa. Para ela, a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte é uma violência com os povos que vivem no entorno do Xingu.
0 comentários:
Postar um comentário