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Familiares dão última cartada por responsabilização de repressores da ditadura

segunda-feira, 3 de maio de 2010

A esperança de movimentos de direitos humanos sobre responsabilização dos envolvidos na ditadura (1964-85) deposita-se quase por completo no julgamento marcado para a Corte Interamericana de Direitos Humanos, em San José, na Costa Rica, entre os dias 20 e 21 deste mês. Após o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir, na última semana, que deve permanecer como está a Lei de Anistia (6.683/79) os recursos dentro do país estão esgotados.

A maioria dos ministros do STF definiu pela rejeição da ação apresentada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que tentava mostrar que crimes comuns não estavam cobertos pelo acordo de 1979.

Teria sido um importante sinal dado pelo Brasil para evitar uma condenação no âmbito do Sistema Interamericano. Com a revisão da anistia, o Estado mostraria que está disposto a condenar os culpados e a esclarecer todos os fatos. Fábio Konder Comparato, advogado que assinou a peça inicial da OAB, considera que a decisão do Supremo é um escândalo de porte internacional e que forçará a condenação pela Corte Interamericana. “Com isso cai por terra todo o projeto do Itamaraty de fazer com que o Brasil ocupe uma cadeira permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas”, analisa.

As posições não apenas dos ministros, mas da Advocacia Geral da União (AGU) e da Procuradoria Geral da República (PGR) durante o julgamento podem ter fechado um panorama negativo para o que vai ocorrer na entidade da Organização dos Estados Americanos (OEA). As duas partes defenderam que deixar a anistia como está não significa negar o passado.


Histórico


A ação 11.552, depois de 15 anos de idas e vindas, pode declarar que o Estado brasileiro é culpado pelo desaparecimento de dezenas de pessoas na Guerrilha do Araguaia e também por não haver buscado o esclarecimento dos fatos. Trata-se de um passo decisivo na possibilidade de forçar o Brasil a fazer justiça no que diz respeito às violações cometidas contra militantes políticos.

Victória Grabois, que perdeu marido, pai e irmão na guerrilha do Araguaia, lembra que as violações aos direitos humanos são crimes regidos por leis, tratados e convenções internacionais, acima de qualquer Estado. “O Brasil, como Estado-membro da OEA, precisa respeitar essa questão. Tanto que Pinochet (Augusto Pinochet, ditador chileno) foi preso em Londres por determinação da Justiça da Espanha”, lembra.

O caso foi apresentado em 1995 ao Sistema Interamericano pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil), pela Human Rights Watch e pelo Grupo Tortura Nunca Mais. Inicialmente, 22 famílias tentavam obter informações sobre as circunstâncias da desaparição e da morte de guerrilheiros do Araguaia, movimento armado fundado pelo PCdoB em 1966 e duramente reprimido entre 1972 e 1975 por cerca de 5 mil agentes policiais.

Ao longo destes 15 anos, o processo alternou-se entre estagnação e passos adiante de acordo com as respostas que o Estado brasileiro dava à questão. Essas famílias esperam desde 1982 a resposta a uma ação apresentada à Justiça Federal. Apenas em 2003 se definiu que os familiares tinham direito à abertura dos arquivos militares a respeito do Araguaia e que os envolvidos nas execuções deveriam ser chamados para depor. Mas o governo brasileiro entrou com recurso e mesmo depois da decisão final, em 2007, deu sinais muito tímidos sobre o tema.

No ano passado, não teve êxito a operação de busca por restos mortais de combatentes. Mais que isso, como revelado à Rede Brasil Atual, a equipe responsável pelas buscas de corpos no Araguaia seria comandada por um general simpatizante da ditadura.

O general Mario Lúcio Alves de Araújo, nomeado pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, afirmou em entrevista dada em 2008 a um jornal que o golpe de 31 de março atendeu a um clamor popular, “impedindo que o Brasil se tornasse um país comunista”. As escavações no Araguaia, por fim, não tiveram sucesso na localização de vítimas.

É por conta do esgotamento das possibilidades internas que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos decidiu dar sequência ao caso, enviando-o à Corte. Em um comunicado, a CIDH manifestou que o encaminhamento do caso à Corte “apresenta uma nova oportunidade para consolidar a jurisprudência sobre as leis de anistia com relação aos desaparecimentos forçados e execuções extrajudiciais e à obrigação dos Estados de investigar, processar e sancionar graves violações dos direitos humanos.”

“É minha última cartada. Espero que o governo brasileiro seja responsabilizado. Se não for pela Corte, aqui no Brasil é tudo muito complicado”, resume Victória Grabois.


Por João Peres, Rede Brasil Atual

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