Os antigos e novos problemas
O Haiti entrou para a história como o primeiro país da América Latina a conquistar a sua independência e decretar o fim da escravidão. A primeira república da América Latina foi uma República Negra! Contudo, a abolição da escravatura não significou abolição da miséria. Os interesses estrangeiros que, inicialmente, tinham como principal objetivo a exportação de matéria prima barata, passou para a instalação de algumas indústrias e o uso de uma força de trabalho extremamente barata. Somado a essa economia excludente, tem-se um país localizado no encontro de placas tectônicas e no caminho da rota de furações e tufões. Essa é a combinação responsável em fazer do Haiti o país mais pobre da América Latina.
Relatos de um grupo de estudantes da Unicamp que atualmente estão no Haiti (http://lacitadelle. wordpress. com/) colaboram, através de postagens, com a divulgação de informações depois do terremoto. Em outros ‘posts’ eles fazem importantes declarações como: o relato de que algumas indústrias em território haitiano privilegiam a mão-de-obra de surdos e mudos, já que estes trabalham rápido e em silêncio. Seria uma coincidência com os preceitos fordistas? Comentam que brancos não circulam nas ruas, a não ser sob uniforme militar. Será medo, repulsa ou simplesmente o desejo de ignorar os custos advindos da “sociedade do consumo”? Há, também, uma acusação grave: a ‘força de paz’ brasileira, em alguns momentos, acaba servindo como um agente repressor dos movimentos sociais reivindicatórios da população.
Os Estados Unidos, ainda a maior potência do planeta, e outros líderes mundiais prometeram ajuda humanitária e financeira. Inclusive algumas celebridades, tais como Angelina Jolie e Brad Pitt, também manifestaram apoio em prol dos haitianos. Sem dúvida, toda esta colaboração é necessária e vital, muitos outros morreriam sem elas.
Quem pensa no Haiti?
Mas, não há motivos para não perguntar: Por que essa ajuda não veio antes? 3 mil pessoas morrerem por ano devido à fome, doenças curáveis e violência pode ser ignorado. A morte de 30 mil, ao mesmo tempo, precisa de ajuda? Imagino o que Obama, o Nobel da paz, responderia a perguntas como estas. É válido gastar milhões para controlar o petróleo, todavia para a fome só quando isso for dar manchete ou se o seu silêncio for ofensivo.
O refrão da música de Gil e Caetano diz: “Pensem no Haiti, o Haiti é aqui, o Haiti não é aqui”. Seria bom se pensássemos mais na pequena ilha da América Central, talvez as ações de cooperação deixassem de ser pontuais. Além disso, poderíamos pensar no Haiti que temos dentro do Brasil. Ao invés de comemorar a “recuperação” da crise, pensar o que significa esse crescimento econômico? E quais suas implicações?
Nesta semana começou, na Globo, o “Big Brother”, na Record, “A Fazenda”, logo começa a Copa do Mundo e arriscamos que tanto a mídia, como o público, vai ocupar seus pensamentos e o seu tempo com esses e outros temas. Até quando as pessoas vão sentar solenemente em seus sofás, se indignarem por meia hora diante dos telejornais, e depois viverem a catarse dos realities shows, onde os sacrifícios e as dores são momentâneas, artificiais e recompensadas por automóveis, viagens e prêmios de milhões de reais? O Haiti, que vai continuar sendo o país mais pobre da América, só será lembrado em um novo desastre ou golpe político. Estamos errados? A história (que é feita pelos homens) certamente dará a resposta..
(*) Lívia Moraes é doutoranda em Ciências Sociais pela Unicamp e Paulo Pastor Monteiro de Carvalho é estudante de Jornalismo na Unesp.
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