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Traduções Bukows #5 e 6: "um poema é uma cidade" e "poema de uma noite escura"

sábado, 29 de setembro de 2012


um poema é uma cidade


um poema é uma cidade repleta de ruas e de esgotos
repleta de santos, heróis, mendigos, loucos,
repleta de banalidades e embriaguez,
repleta de chuvas e trovões e períodos de
seca, um poema é uma cidade em guerra,
um poema é uma cidade perguntando porquê a um relógio,
um poema é uma cidade em chamas,
um poema é uma cidade sob armas
é barbearias cheias de bêbados cínicos,
um poema é uma cidade onde Deus cavalga pelado
pelas das ruas como Lady Godiva,
onde cachorros latem a noite, e correm atrás
da bandeira; um poema é uma cidade de poetas,
a maioria deles muito parecidos
e invejosos e amargos...
um poema é essa cidade agora,
a 50 milhas de lugar nenhum,
às 9:09 da manhã,
o gosto de bebida e de cigarros,
sem policia, sem amantes, andando pelas ruas,
esse poema, essa cidade, fechando suas portas,
barricada, quase vazia,
lúgubre sem lágrimas, envelhecendo sem dó,
as montanhas de rochas rígidas,
o oceano como uma chama lavanda,
uma lua destituída de grandiosidade,
uma pequena música de janelas quebradas...

um poema é uma cidade, um poema é uma nação,
um poema é o mundo...

e agora eu grudo isso sob o vidro
para o escrutínio do editor louco,
e a noite está em outro lugar
e senhoras tênues cinzentas ficam em fila,
cachorro segue cachorro ao estuário,
os trompetes trazem forcas
enquanto pequenos homens discursam sobre coisas
que eles não podem fazer.



poema de uma noite escura


eles dizem que
nada é em desperdício.
ou isso
ou tudo o é.


(Charles Bukowski)
Traduzido por Felipe Ribeiro

Traduções Bukowski #4: "gato malhado"

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

gato malhado




ele usa calça jeans e tênis
e anda com duas garotas jovens
mais ou menos de sua idade.
de vez em quando ele salta
no ar e 
bate os calcanhares.

ele é como um potro jovem
mas de alguma forma ele também me lembra
um gato malhado.

sua bunda é macia e 
ele não tem mais na sua mente
do que tem uma mosca.

ele pula atrás de suas garotas
batendo os calcanhares.

e ele puxa o cabelo de uma
corre para a outra e
aperta seu pescoço.

ele fodeu as duas e
está satisfeito consigo mesmo.
tudo aconteceu
tão fácil para ele.

e eu penso, ah,
meu pequeno gato malhado
que dias e noites
esperam por você.

sua bunda macia será o fim de seu mundo.
sua agonia
será interminável
e as garotas
que agora são suas
logo pertencerão a outros homens
que não conseguiram seus biscoitos
e cremes tão fácil e
tão cedo.

as garotas estão treinando com você
as garotas estão se preparando para outros homens.
para alguém de fora da selva
para alguém de fora da jaula do leão.

eu sorrio enquanto
eu vejo você andando
batendo os calcanhares.

meu deus, garoto, eu temo por você
na noite
em que você se der conta pela primeira vez.

agora é um dia ensolarado.

pule
enquanto
pode.

(Charles Bukowski)
Traduzido por Felipe Ribeiro



Traduções Bukowski #3: "o cadarço"

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

o cadarço


uma mulher, um
pneu furado, uma
doença, um
desejo; medos na sua frente,
medos que se seguram tão firme
que você pode estuda-los
como peças em um
tabuleiro de xadrez...
não são as coisas grandes que
mandam um homem para o
hospicio. para a morte ele está preparado, ou
assassinato, incesto, roubo, incendio, inundação...
não, é a série contínua de pequenas tragédias
que mandam um homem para o
hospicio...
não a morte de seu amor
mas um cadarço que se arrebenta
sem tempo de sobra...
o pavor da vida
é essa multidão de trivialidades
que podem matar mais rápido do que cancer
e que sempre estão presentes –
emplacamentos ou impostos
ou uma carteira de motorista vencida,
ou contração ou demissão,
fazendo-os ou tendo-os feito a você, ou
constipação
multas de transito
formigas ou grilos ou ratos ou cupins ou
baratas ou moscas ou um
gancho quebrado em uma
rede, ou sem gasolina
ou com gasolina demais,
a pia entupiu, o senhorio está bebado,
o presidente não se importa e o governador está
louco.
interruptor quebrado, colchão como um
porco-espinho;
$105 por um ajuste, carburador e bomba de combustível na
Sears Roebuck;
e a conta de telefone subiu e o mercado
caiu
e a corrente da descarga está
quebrada,
e a luz está queimada –
a luz do salão, a luz da frente, a luz de trás,
a luz interior; está
mais escuro do que o inferno
e duas vezes mais
caro.
então há sempre chatos e unhas encravadas
e pessoas que insistem que são
seus amigos;
há sempre tudo isso e pior;
torneira vazando, Cristo e o Natal;
salame estragado, 9 dias de chuva,
abacates de 50 centavos
e língua de figado
roxeada.

ou fazendo-o
como uma garçonete do Norm’s na troca de turnos,
ou como um esvaziador de
penicos,
ou como um lava-rápidos ou um assistente de garçons
ou um ladrão de bolsas de velhinas
deixando-as gritando nas calçadas
com braços quebrados aos 80
anos de idade.

subitamente
2 luzes vermelhas no seu retrovisor
e sangue na sua
cueca;
dor de dente, e $979 por um canal
$300 por um dente de
ouro,
e a China a Rússia e a América, e
cabelo longo e cabelo curto e 
cabelo nenhum, e barbas e sem
rostos, e um monte de zigzag mas sem sucesso
nenhum, exceto talvez por um cara mijando e 
o outro em volta das suas
tripas.

com cada cadarço arrebentado
de cem cadarços arrebentados,
um homem, uma mulher, uma
coisa
entra num
hospicio.

então cuidado
quando você
se curvar.

(Charles Bukowski)
Traduzido por Felipe Ribeiro

Traduções Bukowski #2: "o inferno é um lugar solitário"

domingo, 9 de setembro de 2012

o inferno é um lugar solitário


ele tinha 65 anos, sua mulher tinha 66, tinha
mal de Alzheimer.

ele tinha câncer na
boca.
haviam
operações, tratamentos
radioativos 
que deterioraram os ossos de sua
mandíbula
que então tiveram de ser
presos com arame.

diariamente ele põe sua mulher em
fraldas de borracha
como um
bebê.

não podendo dirigir em sua
condição
ele teve que pegar um taxi para
o centro
médico,
tinha dificuldade para falar,
teve que
anotar as direções.

na sua última visita
eles o informaram que
haveria outra operação: um pouco mais de 
bochecha
esquerda e um pouco mais de língua.

quando ele voltou
ele trocou as fraldas de sua 
mulher
colocou a comida no
microondas, assistiu ao
jornal da noite
e daí foi para o 
quarto, pegou a
arma, colocou na têmpora
dela, atirou.

ela caiu para a 
esquerda, ele sentou no
sofá
colocou a arma na sua
boca, puxou o
gatilho.

os tiros não perturbaram
os vizinhos.

mais tarde
a comida queimada no microondas
perturbou.

alguém chegou, abriu
a porta, viu
tudo aquilo.

logo
a polícia chegou e 
percorreu a rotina
deles, acharam
alguns itens:
um talão de cheques e
uma poupança
fechada com um
balanço de
$1,14

suicídio, eles
deduziram.
em três semanas
haviam dois 
novos inquilinos:
um engenheiro de computação
chamado
Ross
e sua mulher
Anatana
que estudava
balé.

eles pareciam outro
casal
ascendente.

(Charles Bukowski)
Traduzido por Felipe Ribeiro

Traduções Bukowski #1: "a crise"

quarta-feira, 5 de setembro de 2012


Traduções Bukowski



Nessas férias, ganhei um presente da minha irmã: uma coletânea de poemas do Bukowski chamada Pleasures of the Damned, em inglês. São mais de 500 páginas contendo poemas selecionados do velho safado. E eu resolvi começar a marcar os poemas que eu mais gostei do livro e ainda resolvi começar a traduzi-los por simples diversão e também por demonstrar minha admiração por esse poeta (o que não é muito complicado, pois a composição de um poema dele está distante de qualquer forma ou estilo sofisticado, são apenas palavras duras, dizendo o que tem que ser dito).

A ideia é traduzir todos os poemas e postá-los aqui, um por semana, ou até mais. Pretendo cumprir essa meta sem atrasos. A ordem será diversificada - vou postar o poema que me der vontade. 

Mas em fim, nada disso é importante, então aqui vai o primeiro poema.


a crise


demais
de menos

gordo demais
magro demais
ou ninguém.

risadas e
lágrimas

odiadores
amantes

estranhos com rostos iguais
à parte de trás de
uma taxinha

exércitos correndo pelas
ruas de sangue
acenando garrafas de vinho
baionetando e fodendo
virgens.

ou um cara velho em um quarto barato
com uma foto de M. Monroe.

existe uma solidão tão grande nesse mundo
que é possível vê-lá no lento movimento
dos ponteiros de um relógio.

pessoas tão cansadas
multiladas
ora por amor ora por falta de amor.

as pessoas simplesmente não são boas entre si
uma a uma

o rico não é bom com o rico
o pobre não é bom com o pobre.

nós estamos com medo.

nosso sistema educacional nos diz
que todos nós somos
vencedores bundões.

ele não nos disse nada
sobre as sarjetas
ou sobre os suicídios.

ou sobre o terror de uma pessoa
agonizando em qualquer lugar
sozinha

intocado
não mencionado.

regando uma planta.

as pessoas não são boas entre si.
as pessoas não são boas entre si.
as pessoas não são boas entre si.

suponho que elas nunca serão.
eu não peço que elas sejam.

mas algumas vezes eu penso sobre
isso

as contas vão pendurar
a nuvens vão nublar
e o assassino vai decapitar a criança
como morder um pedaço de um sorvete em cone.

demais
de menos
gordo demais
magro demais
ou ninguém

mais odiadores do que amantes.

as pessoas não são boas entre si.
talvez se elas fossem
nossas mortes não seriam assim tão tristes.

enquanto isso eu olho para a haste das
garotas jovens
flores da chance.

deve haver uma maneira.

com certeza deve haver uma maneira da qual ainda
não pensamos.

quem colocou esse cérebro dentro de mim?

ele chora
ele exige
ele diz que há uma chance

eu não vou dizer
“não”.

(Charles Bukowski)

Traduzido por Felipe Ribeiro


 

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